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quinta-feira, 21 de março de 2013

A alteração do rateio de condominio sem quorum especifico é nula e autoriza consignação de valores (vide parte final, acerca do rateio por unidade condominial).



Número do processo:  1.0024.00.121207-5/001(1)   

Númeração Única:  1212075-64.2000.8.13.0024

Relator:                     JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES
Relator do Acórdão:    JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES
Data do Julgamento:   08/04/2010
Data da Publicação:    05/05/2010


Inteiro Teor:               

EMENTA: CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO - CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO - MODIFICAÇÃO - TAXA DE CONDOMÍNIO - RATEIO. A consignação em pagamento, com o depósito judicial da coisa devida, extingue a obrigação do devedor nos casos e forma legais (art. 972 CC/1.916 e art. 334 CC/2002). A Convenção de Condomínio como ato jurídico que é, e, tendo natureza contratual, não está revestida pela imutabilidade e desde que obedecidos os requisitos nela previstos pode ser modificada a qualquer tempo para atender aos interesses comuns da entidade condominial. Não existe direito adquirido do condômino em face das normas convencionais em vigor quando da aquisição da unidade autônoma. Sendo decidido em Assembléia Geral, regularmente convocada, com presença mínima dos condôminos prevista na convenção, a modificação do critério de rateio das despesas condominiais, justa é a recusa do condomínio em não receber valores calculados de acordo com a disposição convencional modificada. V.v. A alteração de cláusula de convenção que delibera acerca de modificação do rateio das despesas comuns, por sua natureza exige maioria absoluta. Sendo nula a assembléia que alterou a convenção de condomínio, modificando a forma de cobrança de taxa condominial é permitido àquele que se vê lesado consignar em juízo o valor que entende correto.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.00.121207-5/001 EM CONEXÃO COM A APELAÇÃO CÍVEL Nº. 1.0024.01.027922-2/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): BRUMA LTDA E OUTRO(A)(S) - APELADO(A)(S): CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO JOÃO EDUARDO II - RELATOR: EXMO. SR. DES. JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 15ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES , na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM NEGAR PROVIMENTO, VENCIDO O VOGAL.
Belo Horizonte, 08 de abril de 2010.

DES. JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Assistiu ao julgamento, pelos apelantes, o Dr. Márcio Gabriel Diniz e, pelo apelado, o Dr. Márcio Henrique Monteiro.

O SR. DES. JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES:

VOTO

Conheço do recurso por presentes os requisitos objetivos e subjetivos para sua admissibilidade.

Os apelantes rebelando-se contra a decisão tomada em Assembléia Geral modificando o critério para rateio das despesas condominiais de igualdade entre as unidades autônomas para proporcional a fração ideal de cada unidade, ajuizaram a presente consignatória contra o apelado, argumentando que a modificação da Convenção de Condomínio ou mesmo do Regimento Interno somente poderia ser feito por votação unânime dos condôminos e assim pretendem depositar em consignação os valores que julgam devidos.

Contestação de fls. 61/63, ilustrada com diversos documentos, sentença de fls. 187/191 inacolhendo o pleito autoral, determinando o pagamento das despesas condominiais a partir de setembro de 2.000, segundo o critério da fração ideal definido no Regimento Interno do Condomínio, mais juros de mora de 0,5%, ao mês, correção monetária a partir do vencimento de cada valor devido, com imposição dos ônus de sucumbência.

Recurso de fls. 192/202 provido pela Sétima Câmara Cível do extinto Tribunal de alçada, e, em acolhendo a preliminar de cerceamento de defesa anulou o processo a partir das fls. 186 inclusive.

Retornando os autos a instância monocrática o feito foi regularmente instruído produzindo as provas desejadas pelas partes, veio a sentença de fls. 393/398, julgando improcedente a ação e condenando os autores, ora apelantes, ao pagamento da taxa condominial a partir de setembro de 2.000 segundo a fração ideal definida no Regimento Interno de fls. 48/54, acrescida de juros de mora de 0,5%, ao mês, até a data de entrada em vigor do novo Código Civil e 1% a partir da referida data, abatendo-se no valor do débito os valores depositados e levantados em juízo, além das custas e honorários.

Embargos de declaração rejeitados, recurso de fls. 404/409, dizendo que a decisão tomada naquela assembléia repercutiu na esfera jurídica de todos e de cada um, reduzindo os encargos para a maioria em detrimento do direito adquirido ferindo o direito de propriedade, porque a mudança de critério no rateio das despesas comuns implicou em alteração substancial do direito de propriedade dos apelantes o que somente seria possível diante do assentimento de todos, constituindo indecorosa afronta ao direito adquirido e de propriedade, porque a mudança de critério de rateio das despesas mensais somente pode ser levado a efeito mediante mudança de todos os proprietários não lhe dando eficácia a decisão tomada por uma parte dos condôminos que não participaram a elaboração da convenção originária.

Invocando doutrina e jurisprudência que julgam respaldar sua tese argumentam que a sentença somente se fundou na letra "g" do artigo 8º da convenção originária do condomínio sem dar importância às demais disposições que exigem quorum qualificado para as deliberações nos casos ali previstos fazendo necessária a unanimidade dos condôminos sobre matéria que altere a propriedade das unidades que é o caso que sustenta a controvérsia sub judice, além do que a ata lavrada padece de irregularidades retiram-lhe toda eficácia.

Recurso respondido às fls. 414/491 impugnando todas as razões recursais, pugnando pelo improvimento.

A ação de consignação em pagamento com procedimento previsto no artigo 890 e seguintes do CPC é meio de extinção da obrigação mediante o depósito judicial da coisa devida exercitável nos casos previstos nos inciso I a VI artigo 973 CC/1.916 tendo como correspondentes os incisos I a V do artigo 335 CC/2002 e entre eles se encontra a recusa do credor em receber o pagamento ou dar quitação devida e o fundamento do pleito em tela se encontra na afirmação constante da inicial que "houve recusa do condomínio em observar o critério de rateio definido na convenção, ou seja, igualdade entre as unidades, bem como, receber as quotas calculadas de acordo com aquele padrão".

A Convenção de Condomínio celebrada em 20 de outubro de 1.992 (doc. fls. 44/47) em sua cláusula nona previa a distribuição igualitária entre as unidades autônomas das despesas do condomínio, enquanto que o artigo 38 do Regimento Interno do mesmo edifício, datado de 28 de março de 1.995 que a taxa de condomínio será proporcional ao valor da fração ideal de cada unidade autônoma.

No entanto, por decisão tomada na Assembléia Geral Extraordinária realizada em 31 de maio de 2.000 (doc. 75/78) com a totalidade de presença de todos os condôminos, por quinze votos a favor e cinco contra foi modificada a cláusula nona da Convenção no sentido que as despesas do condomínio serão rateadas pela fração ideal do terreno de cada unidade o que não afronta o § 1º do artigo 12 da Lei nº. 4.591/64, em pleno vigor quando da realização da assembléia, muito pelo contrário coloca o comando convencional em consonância com o respectivo dispositivo que determina a fixação da cota no rateio de acordo com a fração ideal do terreno de cada unidade salvo disposição em contrário na convenção.

A modificação introduzida na Convenção de Condomínio é perfeitamente válida; primeiro porque tomada em Assembléia Geral Extraordinária com a presença de todos os condôminos preenchendo assim o requisito previsto na letra "g" da cláusula 8ª onde se exige pelo menos a presença de metade dos condôminos para sua modificação; segundo porque a Convenção de Condomínio não está revestida da imutabilidade, podendo a qualquer tempo ser modificada desde que obedecidos os procedimentos para tanto; terceiro porque como obra humana que visa atender os interesses e salvaguardar os direitos de todos os condôminos ela deve se ajustar a estes interesses e direitos na medida que se faz necessário.

Não constituem e nem se transformam em direitos adquiridos, nos termos do § 2º do artigo 6º da Lei de Introdução ao Código Civil, as disposições constantes da Convenção de Condomínio quando da aquisição da unidade pelo condômino, dada a sua mutabilidade por decisão tomada em assembléia devidamente convocada com a presença de número mínimo dos condôminos previsto na própria convenção, porque tais modificações por vontade da maioria visam atender os interesses da própria entidade condominial mesmo que sejam contrários aos interesses da minoria.

Portanto, concluindo pela validade da modificação introduzida na Convenção de Condomínio por decisão tomada em Assembléia Geral regularmente convocada com a presença de todos os condôminos, justa foi a recusa do condomínio em negar recebimento dos valores que lhe foram ofertados pelos apelantes, tendo por fundamento disposição convencional que não mais prevalecia.

Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, confirmando a sentença recorrida pelos seus próprios e sólidos fundamentos.

O SR. DES. TIBÚRCIO MARQUES:

VOTO

De acordo com o eminente Relator.

O SR. DES. ANTÔNIO BISPO:

VOTO

O Eminente Relator está negando provimento à presente apelação por entender pela legalidade da alteração decidida na assembléia geral extraordinária realizada no dia 31 de maio de 2000 (fls. 75/78).

No entanto ouso divergir, data vênia pelos motivos e fundamentos a seguir:

A convenção de condomínio, como ato jurídico que é, depende de requisitos de ordem material e formal para que possa ter a sua eficácia obrigatória.

Na assembléia ora discutida observo que no aspecto formal não ficou demonstrado pelo condomínio apelado que aludida reunião condominial foi devidamente precedida de convocação na qual todos os condôminos tenham sido convocados com advertência especial de que naquela oportunidade seria deliberado acerca da alteração da forma de cobrança das despesas condominiais.

Portanto viciada a convenção nesse aspecto.

Não fosse esse defeito na forma, observo que o quorum de tal deliberação, dada a sua importância na vida condominial, deveria ser por unanimidade já que se trata de alteração de um direito devidamente consolidado por ocasião da instituição da convenção de condomínio.

Não bastassem esses dois defeitos de ordem formal constato pela documentação apresentada pelo condomínio réu que grande parte dos condôminos eram representados por procuração pelo aclamado presidente da assembléia que capitaniava o saque ao patrimônio dos moradores da cobertura.

Porém sobre esse aspecto abordaremos mais adiante nesse voto.

Além de todos esses empecilhos, vê-se que a ata da assembléia foi assinada posteriormente, circunstância que nos remete a um voto do Ministro Massami Uyeda, que confirma uma decisão por mim proferida em primeira instância da qual se destaca a seguinte ementa:

"A assembléia, na qualidade de órgão deliberativo, é palco onde, sob os influxos dos argumentos e dos contra-argumentos, pode-se chegar ao voto que melhor reflita a vontade dos condôminos e, portanto, não é de admitir-se a ratificação posterior para completar quorum eventualmente não verificado na sua realização,". (REsp 1.120.140-MG (2009/0016163-4)).

No caso dos autos até procuração foi posteriormente outorgada ao capitão da assembléia.

Sob o aspecto material nunca é demais salientar que são requisitos do ato jurídico: Agente capaz, objeto lícito e forma prescrita e não defesa em lei.

DA ILEGALIDADE

Muito embora a Lei 4.591/64 não vede expressamente a instituição em convenção da cobrança das despesas condominiais de acordo com a fração ideal, tem-se que tal forma de rateio de despesas é muito própria e justa para o caso de construção em condomínio, sendo esta a forma mais justa e equilibrada de não onerar em demasiado qualquer dos condôminos participantes para a edificação.

No entanto, essa forma de rateio para as despesas condominiais gera um desequilíbrio que não atende a função social e a legalidade que o ato necessita principalmente porque incide sobre um direito já adquirido no momento da instituição inicial e da aquisição da unidade condominial.

Justifico: as coberturas não consomem mais elevador, mais porteiro, mais energia das áreas comuns, nem contribui além das demais com essas despesas de modo a lhe impor o ônus de arcar com parte das despesas que deveriam ser pagas pelos condôminos das unidades padrão.

A inicial embora de forma sucinta, aborda com muita perspicácia a questão que veio a se tornar a coqueluche da histeria da pobreza. Explico: todos ficamos incomodados e revoltados com o "olhador de carros" que nos extorque com ameaças de causar dano ao nosso patrimônio móvel.

Trata-se de verdadeira extorsão com a qual não concordamos, mas nos acomodamos e deixamo-nos extorquir.

No caso em julgamento a situação não difere. Imagino o Sr. Ricardo Néri Leite Guimarães munido de algumas procurações se auto proclama presidente da assembléia (fls. 62/65 e 104/107) e transfere para os proprietários das unidades coberturas despesas que são suas, somente porque moradores daquelas unidades foram mais afortunados podendo ali habitar.

Nunca morei em uma cobertura, porém, jamais irei exigir de alguém que ali more que pague as despesas que são de minha responsabilidade.

Sr. Presidente, Sr. Relator, essa alteração de forma de cobrança das taxas de condomínio por rateio calculado sobre a fração ideal é ilegal, principalmente se altera uma situação jurídica pré existente.

Não fosse ilegal seria abusiva já que é verdadeiro abuso valer-se de tais argumentos para impor a outrem o pagamento de despesas que devem ser justas e proporcionais na medida do uso da coisa comum.

Alem dessas duas questões já abordadas e em face do evidente interesse de parte dos moradores das unidades tipos, os mesmos são ilegítimos para instituir tal ônus sobre a propriedade dos autores.

A doutrina e a jurisprudência vem se firmando no sentido de que não se pode instituir o rateio com base na fração ideal para as despesas condominiais tendo em vista que a função social da taxa condominial é exatamente distribuir de forma justa e equânime o uso das áreas comuns do condomínio.

Tendo em vista a flagrante ilegalidade da alteração procedida tem-se que não é justa a recusa do condomínio réu.

Ante ao exposto DOU PROVIMENTO AO APELO e nos termos do inciso I, do art. 269 do CPC julgo procedente a consignação em pagamento, extinguindo a obrigação pelo depósito efetuado.

Condeno o condomínio réu ao pagamento das custas e despesas processuais, como também honorários advocatícios que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, devidamente corrigido a partir do ajuizamento da ação.

Fonte:  TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Processo:  1212075-64.2000.8.13.0024

Ilegalidade da cobrança de tarifa minima com base no nº de economias em condominios com um único hidrômetro, sem considerar o efetivo consumo de água


RECURSO ESPECIAL Nº 982.938 - RJ (2007⁄0207720-9)
RECORRENTE: COMPANHIA ESTADUAL DE ÁGUAS E ESGOTOS CEDAE
RECORRIDO: CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO PALÁCIO DAS INDÚSTRIAS


RELATÓRIO

EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de recurso especial interposto pela Companhia Estadual de Águas e Esgoto - CEDAE, com base  o art. 105, III, letras "a" e "c", da Constituição da República, com objetivo de reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, cujos fundamentos encontram-se  sintetizados por meio da seguinte ementa:

Apelação - Ação ordinária, CEDAE, fornecimento de água à condomínio de edifício comercial - Forma de cobrança - Tarifa mínima por unidade imobiliária - Impossibilidade - Hidrômetro - Ilegal a cobrança da tarifa mínima multiplicada pelo número de economias - art. 42 do Código de Defesa do Consumidor - Desprovimento do recurso.
(fl. 252)

Opostos embargos de declaração a Corte de origem houve por bem rejeita-los.
No recurso especial o CEDAE argumenta, em síntese, que:
a) a rejeição dos embargos de declaração revela que a prestação jurisdicional não foi dada em sua plenitude, de modo a configurar a afronta aos arts. 165, 458 e 535, todos  do CPC;
b) a cobrança pela tarifa mínima multiplicada pelo número de economias é legal, advertindo que foi instituída pelo Decreto Federal 82.587⁄78, que regulamenta a Lei nº 6.528⁄78;
c) para configurar a cobrança em dobro do valor excessivamente pago, a teor do parágrafo único do art. 42 do CDC, se faz necessário que configure ato ilícito, ou seja, que a cobrança seja praticada com dolo ou culpa, situação que não teria ocorrido nos autos.
Apresentadas as contra-razões, subiram os autos por força do juízo positivo de admissibilidade.
É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 982.938 - RJ (2007⁄0207720-9)

EMENTA

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - . FORNECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTO CONDOMÍNIO EDILÍCIO - MULTIPLICAÇÃO DO CONSUMO MÍNIMO PELO NÚMERO DE UNIDADES AUTÔNOMAS (ECONOMIAS) - IMPOSSIBILIDADE. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DO VALOR COBRADO, COM BASE NO CDC - POSSIBILIDADE.
1. A prestação jurisdicional foi dada em sua plenitude, sendo examinados os pontos agitados pela parte recorrente, ficando afastada a afronta aos arts. 165, 458 e 535, todos  do CPC.
2 A Segunda Turma, pacificou o entendimento segundo o qual nos condomínios em que o total de água consumida é medido por um único hidrômetro, é ilegal a cobrança de tarifa mínima com base no número de economias, sem considerar o efetivo consumo de água (REsp 726582⁄RJ, Rel. p⁄ Acórdão Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, julgado em 15⁄09⁄2009, DJe 28⁄10⁄2009).
3. Direito à devolução em dobro reconhecido com base no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
4. Recurso Especial não provido.

VOTO

EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): De início, cumpre examinar se a rejeição dos embargos de declaração revela a afronta aos arts. 165, 458 e 535, todos  do CPC.
A parte recorrente sustentou em seus embargos de declaração que a Corte de origem foi omissa quanto a "inépcia da inicial, a decadência⁄prescrição e a ausência dos requisitos autorizadores para a concessão dos efeitos da tutela" (fl. 260).
Nas razões de apelação (cf. fls. 205⁄209) , observa-se que foram impugnados os seguintes pontos:
1) inépcia da inicial, tendo em vista a necessidade de pedido certo e determinado;
2) decadência⁄prescrição para o consumidor reclamar do fornecimento do serviço;
3) ausência do preenchimento dos requisitos autorizadores para a concessão da antecipação de tutela, prevista  teria ocorrido, pois não foram observados os requisitos do art. 273 do CPC.
Colhe-se do acórdão que efetivamente foram apreciadas as questões agitadas, conforme se vê da fl. 253:

..., a petição inicial satisfaz a todos os requisitos previstos nos arts. 282 a 286 do Código de Processo Civil.
Tratam os autos de relação jurídica continuada, na qual o prazo decadencial para reclamar vícios na prestação dos serviços se renova a cada mês.
Assim sendo, rejeitam-se as preliminares do recurso"

À evidência que não se verifica uma prestação jurisdicional deficiente, mas, ao contrário, foi dada em sua plenitude e, por certo, contrária à tese defendida pela recorrente. Aliás, em relação ao art. 273 do CPC não resta dúvida que o acórdão da apelação chancelou a sentença nesse ponto, na medida em que afastou qualquer vício de cerceamento de defesa e afronta a qualquer dispositivo. Colocada a questão nestes termos, cumpre examinar se é legal a cobrança de tarifa mínima pelo número de economias e não por unidade de hidrômetro. Observo que sempre compartilhei, em harmonia com a jurisprudência da Primeira Seção, do entendimento de que é legal a cobrança da taxa de água pela tarifa mínima, mesmo que haja hidrômetro que registre consumo inferior àquele. Confira-se, a propósito os precedentes abaixo:

ADMINISTRATIVO. SERVIÇO PÚBLICO. TAXA DE ÁGUA. COBRANÇA DE TARIFA PELO CONSUMO MÍNIMO. LEGALIDADE. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. É lícita a cobrança da taxa de água pela tarifa mínima, mesmo que haja hidrômetro que registre consumo inferior àquele. Inteligência das disposições legais que regulam a fixação tarifária (artigo 4º, da Lei 6.528⁄78 e artigos 11 caput, 11, § 2º e 32 do Decreto nº 82.587⁄78). Recurso provido. (REsp 416.383, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, unânime, julgado em 27⁄8⁄2002, DJ 23⁄9⁄2002, pág. 254)

DIREITO ADMINISTRATIVO – POLÍTICA TARIFÁRIA NO FORNECIMENTO DE ÁGUA – COLOCAÇÃO DE HIDRÔMETROS – PRECEDENTES DO STJ.
1. A política de tarifação dos serviços públicos concedidos, prevista na CF (art. 175), foi estabelecida pela Lei 8.987⁄95, com escalonamento na tarifação, de modo a pagar menos pelo serviço o consumidor com menor gasto, em nome da política das ações afirmativas, devidamente chanceladas pelo Judiciário (precedentes desta Corte).
2. Acórdão recorrido que, distanciando-se da lei, condena o valor do consumo mínimo estabelecido pela política nacional de tarifas.
3. A Lei 8.987⁄95, como o Decreto 82.587⁄78, revogado em 1991 pelo Decreto 5, deu continuidade à prática do escalonamento de preços.
4. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 759.362⁄RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01.06.2006, DJ 29.06.2006 p. 184)

Ocorre, porém, que em 15 de setembro do corrente ano, quando do julgamento do REsp nº 726.582-RJ, a Segunda Turma, por maioria de votos, houve por bem rever o entendimento anteriormente firmado e estabelecer que nos condomínios em que o consumo total de água é medido por um único hidrômetro, é ilegal a cobrança de tarifa mínima de água com base no número de economias, sem considerar o consumo efetivamente registrado.
Para melhor visualizar essa afirmação, merece ser trazido à colação o referido precedente:

ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTO. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. MULTIPLICAÇÃO DO CONSUMO MÍNIMO PELO NÚMERO DE UNIDADES AUTÔNOMAS (ECONOMIAS). IMPOSSIBILIDADE.
1. O STJ pacificou o entendimento de que, nos condomínios em que o consumo total de água é medido por um único hidrômetro, é ilegal a cobrança de tarifa mínima de água com base no número de economias, sem considerar o consumo efetivamente registrado.
2. Recurso Especial não provido.
(REsp 726582⁄RJ, Rel. Ministra  ELIANA CALMON, Rel. p⁄ Acórdão Ministro  HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15⁄09⁄2009, DJe 28⁄10⁄2009)

O referido julgado se posicionou na linha de entendimento adotado pela Primeira Turma, conforme o precedente abaixo reproduzido:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM ANULAÇÃO DE COBRANÇA E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. FORNECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTO. CONDOMÍNIO EDILÍCIO COMERCIAL. TARIFA MÍNIMA. LEGALIDADE (LEI 6.528⁄78, ART. 4º; LEI 11.445⁄2007, ART. 30). MULTIPLICAÇÃO DO CONSUMO MÍNIMO PELO NÚMERO DE UNIDADES AUTÔNOMAS (SALAS COMERCIAIS). IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 39, V e X, do CDC, E 6º, § 1º, DA LEI 8.987⁄95. RESTITUIÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE.
(...)
4. Nos condomínios edilícios comerciais e⁄ou residenciais, onde o consumo total de água é medido por um único hidrômetro, a fornecedora não pode multiplicar o consumo mínimo pelo número de unidades autônomas, devendo ser observado, no faturamento do serviço, o volume real aferido.
5. O cálculo da CEDAE desconsidera a ratio legis subjacente à finalidade da tarifa mínima, instituída no escopo de se assegurar a viabilidade econômico-financeira do sistema, e não para proporcionar lucros abusivos à custa dos usuários.
6. São direitos básicos do consumidor a proteção contra práticas abusivas no fornecimento de serviços e a efetiva prevenção⁄reparação de danos patrimoniais (CDC, art. 6º, IV e VI), sendo vedado ao fornecedor condicionar o fornecimento de serviço, sem justa causa, a limites quantitativos, exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva, bem como elevar sem justa causa o preço de serviços (CDC, art. 39, I, V e X).
7. Os usuários têm direito ao serviço público adequado, assim entendido aquele que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas (Lei 8.987⁄95, arts. 6º, § 1º, e 7º, I).
8. A remuneração pelo fornecimento de água e esgotamento sanitário não tem natureza jurídica tributária (taxa), mas constitui tarifa cujo valor deve guardar relação de proporcionalidade com o serviço efetivamente prestado, sob pena de enriquecimento sem causa.
9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido, apenas para se determinar a restituição simples dos valores indevidamente recolhidos pela CEDAE, acrescidos de juros moratórios legais e correção monetária.
(grifos não originais - REsp 655130⁄RJ, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03⁄05⁄2007, DJ 28⁄05⁄2007 p. 287)

Com base nos precedentes acima reproduzidos, percebe-se que os argumentos expendidos pela parte recorrente não merecem prosperar, na medida em que estabelece a relação entre a concessionária de serviço público e seus usuários, à luz do Código de Defesa do Consumidor.
A propósito, no que se refere à suposta afronta ao parágrafo único do art. 42 do CDC, observo que já houve pronunciamento desta Corte Superior de Justiça no sentido de que basta a culpa daquele que cobrou em demasia a prestação do serviço, a qual pode ser afastada somente na hipótese de engano justificável. Confira-se o precedente desta Corte Superior de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO - VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA - PIS⁄COFINS - REPASSE AO CONSUMIDOR NA FATURA TELEFÔNICA - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA ANATEL - TESE ACERCA DA INEXISTÊNCIA DE ERRO NO PAGAMENTO: AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO - ABUSIVIDADE DA COBRANÇA RECONHECIDA POR ESTA CORTE - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - POSSIBILIDADE.
1. Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide.
2. Prevalece no STJ o entendimento de que a ANATEL não tem legitimidade passiva para responder pela cobrança indevida de valores levada a efeito pelas empresas de telefonia na conta telefônica.
3. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, dada a ausência de prequestionamento.
4. A Segunda Turma desta Corte firmou entendimento no sentido da ilegalidade do repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica, bem como acerca da má-fé das empresas de telefonia e, por consequência, da abusividade dessa conduta.
5. Direito à devolução em dobro reconhecido com base no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido.
(grifos não originais - REsp 910.784⁄RJ, Rel. Ministra  ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 04⁄06⁄2009, DJe 23⁄06⁄2009)

RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. CONSUMIDOR. DESTINATÁRIO FINAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. APLICAÇÃO DO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 8.078⁄90. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.  AÇÃO DE NATUREZA CONDENATÓRIA. INCIDÊNCIA SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, DO CPC.
I - O Tribunal a quo afastou a incidência do art. 42, parágrafo único, do CDC, que determina a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamentes nas relações de consumo, pela ausência de dolo (má-fé) do fornecedor. Entretanto, basta a culpa para a incidência de referido dispositivo, que só é afastado mediante a ocorrência de engano justificável por parte do fornecedor.
II - No circunlóquio fático delimitado pelo acórdão recorrido, ressai a não-demonstração, por parte da recorrida, da existência de engano justificável, tornando-se aplicável o disposto no artigo 42, parágrafo único, da Lei 8.078⁄90. Precedentes: REsp nº 1.025.472⁄SP, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJe de 30⁄04⁄2008; AgRg no Ag nº 777.344⁄RJ, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de 23⁄04⁄2007;  REsp nº 263.229⁄SP, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 09⁄04⁄2001.
III - Havendo condenação, os honorários advocatícios devem ser fixados sobre o valor da condenação, nos termos do que dispõe o art. 20, § 3º, do CPC . Precedentes: REsp nº 874.681⁄BA, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJe de 12⁄06⁄2008; AgRg no Ag nº 516.249⁄PR, JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJ de 28⁄06⁄2004; AgRg no REsp nº 665.107⁄SC, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 14⁄03⁄2005.
IV - Recurso especial conhecido e provido.
(grifos não originais - REsp 1085947⁄SP, Rel. Ministro  FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04⁄11⁄2008, DJe 12⁄11⁄2008)

Diante do exposto, nego provimento ao recurso especial.
É como voto.

Alienação Fiduciaria - Desnecessidade de pagamento integral. Devedor pode purgar a mora apenas as parcelas vencidas e manter contrato.



Relator:  NICOLAU MASSELLI 
Relator do Acórdão:  NICOLAU MASSELLI
Data do Julgamento:  10/06/2010
Data da Publicação:  07/07/2010 
Inteiro Teor:    

EMENTA: AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - DECRETO LEI 911/69 - PURGA DA MORA - PARCELAS VENCIDAS - RECURSO NÃO PROVIDO.- A melhor interpretação quanto ao disposto no §2º, do artigo 3º, do Decreto Lei 911/69, é a de que o pagamento da integralidade da dívida pendente é uma faculdade do devedor, caso pretenda a restituição do bem livre de qualquer ônus, podendo optar pelo pagamento apenas das parcelas vencidas, hipótese em que o bem lhe será restituído com a manutenção do encargo da alienação fiduciária.

AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL N° 1.0512.09.063685-7/002 - COMARCA DE PIRAPORA - AGRAVANTE(S): BANCO FINASA S/A - AGRAVADO(A)(S): CASSIA APARECIDA RIBEIRO TRINDADE - RELATOR: EXMO. SR. DES. NICOLAU MASSELLI

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador FRANCISCO KUPIDLOWSKI , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.

Belo Horizonte, 10 de junho de 2010.

DES. NICOLAU MASSELLI - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. NICOLAU MASSELLI:

VOTO

Reunidos os pressupostos de sua admissibilidade, conheço do recurso.

Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por Banco Finasa S/A., em face da douta decisão de 1º grau (fls.77/82), proferida nos autos da Ação de Busca e Apreensão proposta em desfavor de Cássia Aparecida Ribeiro Trindade, ora agravada, que permitiu que a agravada promovesse a purga da mora, depositando o valor das parcelas vencidas, revogando a liminar de busca e apreensão do bem objeto do contrato.

Assim, inconformada com tal decisão em primeiro grau, a agravante interpôs o presente recurso com pedido de efeito suspensivo, sob o fundamento de que a mora da agravada é inequívoca, provocando o vencimento antecipado do contrato, motivo pelo qual a mesma é responsável pelo pagamento integral avençado.

Assim, defende de que diante do vencimento antecipado a purga da mora somente pode se dar com o depósito integral das parcelas vencidas e vincendas, acrescidas de encargos.

Pugna assim, pelo reconhecimento da mora da devedora, permitindo que o banco permaneça na posse do bem, com consequente intimação da agravada para depósito integral do valor da dívida.

O pedido de efeito suspensivo foi deferido fls.91/92.

Informações do Magistrado Singular às fls. 98-TJ.

Apresentada contraminuta pela agravada fls.100/106.

Passo à análise das razões recursais.

Através da análise dos autos, verifico que a irresignação da agravante versa quanto à oportunidade concedida pelo juízo de purga da mora, através do depósito apenas das parcelas vencidas acrescida de seus encargos, o que levou à revogação da liminar de busca e apreensão do bem objeto do contrato firmado entre as partes.

Com a devida vênia, entendo que a decisão agravada não merece reparos.

Nos termos do §2º, do artigo 3º, do Decreto Lei 911/69, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus.

Apesar do supracitado dispositivo legal mencionar o pagamento da integralidade da dívida pendente, entendo que a interpretação literal do aludido artigo acaba por inviabilizar a purga da mora por parte do devedor que se encontra em atraso com o pagamento de algumas das prestações contratadas e, por conseguinte, impede a conservação do contrato, que deveria ser a finalidade perseguida, em observância ao princípio da preservação dos contratos e de sua função social.

Nesse sentido, o DL n° 911/69, ao possibilitar que o devedor fiduciante pague apenas a integralidade da dívida, viola o disposto no art. 54, § 2°, do CDC, que permite a instituição de cláusula resolutiva nos contratos de adesão, contudo, desde que seja alternativa e à escolha do consumidor.

Destarte, tenho comigo que a melhor interpretação é a de que o pagamento da integralidade da dívida pendente é uma faculdade do devedor, caso pretenda a restituição do bem livre de qualquer ônus, ou seja, do ônus da alienação fiduciária. Por outro lado, caso opte pelo pagamento apenas das parcelas vencidas acrescidas de seus encargos, terá direito à restituição do bem, porém, com a manutenção do encargo da alienação fiduciária.

Nesse sentido é a jurisprudência deste Egrégio Tribunal:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO - PEDIDO LIMINAR QUE SE DEVE DEFERIR COMPROVADA A MORA DO DEVEDOR - ART. 3º, § 1°, DO DECRETO-LEI N° 911/69 - PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA PENDENTE, ENTENDIDA ESTA COMO PRESTAÇÕES JÁ VENCIDAS - INTELIGÊNCIA DO ART. 54, § 2°, DO CDC. Constituída propriedade fiduciária de bem móvel infungível, e apresentando-se a instituição financeira como credora fiduciária, imperativa a incidência do DL n° 911/69, com as modificações introduzidas pela Lei n° 10.931/04, seja para observância do direito material (Código Civil, art. 1.368-A), seja para aplicação do direito processual (DL n° 911/69, art. 8-A). Comprovado o inadimplemento do devedor (conforme disciplina o art. 2°, § 2°, do DL n° 911/69) e havendo pedido expresso por parte do credor fiduciário para concessão liminar de busca e apreensão do bem alienado, obrigatório o deferimento de tal pleito, sob pena de negativa de vigência de lei federal. O DL n° 911/69, ao permitir que o devedor fiduciante pague somente a integralidade da dívida, afastando-se a purgação da mora, acaba por ensejar interpretação que afronta diametralmente o disposto pelo art. 54, § 2°, do CDC, vez que admite a extinção antecipada do negócio jurídico, impondo-se, ex vi legis, a resolução contratual, à margem da orientação volitiva do consumidor. A purgação da mora deve ser considerada como expressão do diploma consumerista, vista como regra protetiva e, portanto, dotada de status de norma constitucional, alçada a direito fundamental (art. 5º, inciso XXXII, da Constituição da República) e erigida a princípio da ordem econômica (art. 170, inciso V).(Agravo de Instrumento nº 1.0702.08.431975-6/001 - Rel. Des. Claudia Maia)"

AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. POSSIBILIDADE DE PURGA DA MORA. PAGAMENTO DAS PARCELAS VENCIDAS. A purga da mora, na ação de busca e apreensão, deve compreender as parcelas vencidas até a data do depósito, acrescidas dos encargos contratualmente estabelecidos, sendo desnecessário o integral depósito das parcelas vincendas. Interpretação mais favorável. A despeito da norma insculpida na reforma ao diploma legal em apreço, a melhor interpretação do artigo nos conduz a uma conclusão sistemática no sentido de que, a purga da mora não pode corresponder ao entendimento de que seja necessária a liquidação do contrato, podendo ser do valor do débito em aberto e seus encargos atualizados. (Recurso nº1.0126.08.011693-5/001 - Rel. Des. FERNANDO CALDEIRA BRANT)

Neste contexto, não merece retoque a decisão recorrida, que considerou purgada a mora, através do depósito das parcelas vencidas, acrescidas de seus encargos.

Destarte, nego provimento ao recurso para manter a decisão agravada.

Custas pelo agravante.

Fonte: TJ/MG

Aumento da mensalidade do plano de saude por mudança de faixa étaria é ilegal.


Trata-se, na origem, de ação interposta por instituto de defesa do consumidor contra sociedade empresária de plano de saúde na qual se discute a validade de cláusula fixada em contrato de serviço médico-hospitalar que reajusta o valor da prestação em razão de mudança de faixa etária. A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, entendeu que não há como considerar violador do princípio da isonomia o reajuste autorizado por lei em razão de mudança de faixa etária, uma vez que há um incremento natural do risco que justifica a diferenciação, ademais quando já idoso o segurado. Conforme o disposto no art. 15, § 3º, da Lei n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) e no art. 14 da Lei n. 9.656/1998, não é possível, por afrontar o princípio da igualdade, que as seguradoras, em flagrante abuso do exercício de tal direito e divorciadas da boa-fé contratual, aumentem sobremaneira a mensalidade dos planos de saúde, aplicando percentuais desarrazoados, que constituem verdadeira barreira à permanência do idoso no plano. Se assim fizessem as seguradoras, criariam fator de discriminação do idoso com o objetivo escuso e ilegal de usar a majoração para desencorajar o segurado a permanecer no plano, o que não pode ser tolerado. Para a validade dos reajustes em razão de mudança da faixa etária, devem ser atendidas as seguintes condições: previsão no instrumento negocial, respeito aos limites e demais requisitos estabelecidos na Lei n. 9.656/1998 e observância do princípio da boa-fé objetiva, que veda reajustes absurdos e aleatórios que onerem em demasia o segurado. Caso algum consumidor perceba abuso no aumento de sua mensalidade em razão de mudança de faixa etária, aí sim se poderá cogitar de ilegalidade, cujo reconhecimento autorizará o julgador a revisar o índice aplicado, seja em ação individual ou coletiva. Com esses fundamentos, a Turma, por maioria, deu provimento ao recurso. REsp 866.840-SP, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 7/6/2011.

FONTE: STJ 

Processo: REsp 866840/SP

terça-feira, 19 de março de 2013

Plano de saúde é condenado por negar angioplastia de emergência


A Juíza de Direito Substituta 11ª Vara Cível de Brasília condenou o Plano de Saúde Sulamérica a arcar com os custos de angioplastia de emergência, a ressarcir o valor de R$ 2.400,00, e a pagar indenização, por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 a paciente.

Afirmou o paciente ser conveniado da Sulamérica desde setembro de 2011 e que em junho de 2012 passou mal, sendo diagnosticado com 95% de comprometimento de uma artéria do coração. Foi solicitado pelo médico que lhe atendeu uma angioplastia de emergência, que foi negada pelo plano de saúde. No mesmo dia, em razão de seu quadro médico, foi obrigado a realizar um exame de cateterismo cardíaco, cujo pagamento também foi negado pela Sulamérica, tendo arcado com a despesa de R$ 2.400,00.

A Sulamérica não apresentou contestação, foi então decretada a revelia, sendo considerados verídicos os fatos alegados pelo autor com relação a sua pessoa. Foi realizada uma audiência de instrução e julgamento, na qual foi colhido o depoimento pessoal do autor e de uma testemunha, ouvida como informante.

A Juíza decidiu que “o que ocorreu ao autor se tratou claramente de um quadro de emergência. Não foi uma cirurgia eletiva, mas sim de urgência, que drasticamente se impôs para salvar a sua vida. (...) Pasme-se: o médico responsável requer uma cirurgia de emergência sob risco de morte e o seguro saúde se manifesta no sentido de que há de se esperar por mais de um ano ainda. (...) Situações como esta atentam contra a lei. É a própria Lei nº 9.656/98 que, ao estabelecer as garantias mínimas que deverão haver em todo contrato de plano de saúde, dispõe sobre o prazo máximo de vinte e quatro horas em se tratando de cobertura para casos de urgência e emergência. (...) Logo, cláusulas que impeçam a cobertura imediata de situações de emergência são tidas por abusivas e, portanto, nulas segundo a inteligência do Código de Defesa do Consumidor. (...) Assim, o valor desembolsado pelo autor lhe deve ser restituído".

Com relação aos danos morais causados em razão da negativa de cobertura, “a jurisprudência vem reconhecendo o direito à indenização. Considera-se ser um dissabor que extrapola a mera imposição de cláusula abusiva o fato de o doente, já debilitado pela situação médica que vivencia, ser submetido a mais estresse e angústia diante da notícia de que seu plano de saúde não lhe acobertará, levando-se em conta que o plano de saúde - no mais das vezes pago em dia e sem falhas - foi contratado exatamente para dar ao contratante que vem a adoecer maior tranquilidade em horas de aflição como essa. Comum é que o consumidor/paciente não tenha recursos para custear o que precisa e isso o leve a um compreensível estado de desespero, indenizável pela via do dano moral. (...) Assim, procedente o dano moral”, decidiu.

Processo : 2012.01.1.086505-2

Fonte: TJDF - Tribunal de Justiça do Distrito Federal

quarta-feira, 6 de março de 2013

FORNECIMENTO DE AGUA - Ilegalidade da suspensão e cobrança de consumo contra quem não a consumiu

Fato corriqueiro é a cobrança indevida de consumo de água e o corte de fornecimento, contra quem não consumiu. Assim tem ocorrido contra o comprador do imóvel, com relação a dívida de água deixada pelos vendedores, contra o locador do imóvel pelas dívidas do locatário, contra novo ocupante do imóvel.. e por ai afora.

Ainda mais corriqueiro e ilegal é o condicionamento da religação ou continuidade do fornecimento de água com o pagamento de dívida pretérita e de terceiros.

Essas são praticas abusivas do fornecedor dos serviços de água, que tenta impingir uma obrigação decorrente de  uma relação pessoal, de consumo, contra quem não contratou e dos serviços não tirou proveito.

A jurisprudência maciça é no sentido de "o débito tanto de água como de energia elétrica é de natureza pessoal, não se vinculando ao imóvel. A obrigação não é propter rem", de modo que não pode o ora recorrido ser responsabilizado pelo pagamento de serviço de fornecimento de água utilizado por outras pessoas."  (STJ, (REsp 890572, Rel. Min. Herman Benjamin, Data da Publicação 13/04/2010, REsp 1267302/SP, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, julgado 08/11/2011).

Portanto, se você estiver sendo cobrado por consumo de água que não lhe diz respeito, não hesite em reclamar, exija seus direitos.

Para ilustrar, segue uma sentença bastante completa a respeito da ilegalidade de cobrança de conta de consumo de água contra quem não a consumiu.

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Processo: 0018211-46.2012.8.26.0008
Classe: Procedimento Sumário
Área: Cível
Assunto: Fornecimento de Água
Distribuição: Livre - 25/09/2012 às 17:07
5ª Vara Cível - Foro Regional VIII - Tatuapé

Reqte:  Antonio Sorvillo
Advogado: Cassio Wasser Gonçales 
Advogado: Fabio Fernando de Oliveira Belinassi

Reqdo:  Sabesp Companhia de Saneamento Basico do Estado de São Paulo
Advogada: Rosa Maria Camilo de Lira Gasperini

VISTOS. Trata-se de ação declaratória de inexigibilidade de débito pretérito de água com pedido de liminar, proposta por ANTONIO SORVILLO em face de COMPANHIA DE SANEAMENTO BÁSICO DO ESTADO DE SÃO PAULO - SABESP, alegando, em síntese, que é proprietário do imóvel situado na Rua Serra de Bragança, nº 554, Tatuapé, São Paulo-Capital, que esteve alugado para Abel Marcos Castro e outros no período de 16/08/2007 a 22/08/2012, mediante contrato de locação escrito, sendo que retomada a posse do imóvel apenas em 22/08/2012, através de regular ação de despejo, tomou conhecimento da existência de débitos de água no período de 08/09/2011 a 07/03/2012, no valor de R$ 12.703,82, cujo pagamento lhe foi exigido pela ré, sob pena de corte no fornecimento de água e esgoto. Diz que tal prática é abusiva, porque o débito é pretérito e a obrigação é pessoal e não de natureza propter rem, razão pela qual requer, em caráter liminar, seja mantida a continuidade do fornecimento de água ao imóvel, providência esta a ser tornada definitiva no mérito, com declaração de inexigibilidade do débito relativo ao período de 16/08/2007 a 22/08/2012.

Deferida a liminar pretendida, a ré foi citada e ofereceu contestação, alegando, preliminarmente, a impossibilidade jurídica do pedido, ante a ausência do direito ao fornecimento sem contraprestação. No mérito, sustentou a improcedência, ao argumento de que o autor não negou a existência das dívidas em aberto; que a natureza das contas de água é propter rem, o que indica sua vinculação ao imóvel e não à pessoa que o ocupa, razão pela qual sem o pagamento da dívida tarifária incidente sobre o imóvel, não há possibilidade de ser mantido o fornecimento de água; que existe solidariedade prevista no artigo 19, parágrafo 2º do Decreto Estadual nº 41.446/96; e que a interrupção do fornecimento de água se fez possível conforme permissivo legal.

Registre-se réplica, oportunidade em que o autor requereu a aplicação de pena por litigância de má-fé.

As partes não manifestaram interesse na produção de outras provas e designação de audiência de tentativa de conciliação.

É o relatório.

FUNDAMENTO E DECIDO.

O caso é de julgamento imediato, na forma do artigo 330, inciso I do Código de Processo Civil, pois não há controvérsia sobre a matéria de fato.

Debate-se, isto sim, sobre a responsabilidade e sua extensão, do proprietário de imóvel servido pelo fornecimento de água, frente às dívidas deixadas pelo locatário.

Respeitada convicção em contrário, inclusive já defendida outrora, e abraçada por não poucas decisões, penso que o dever de pagamento de débitos de consumo de água e energia elétrica constitui obrigação pessoal do consumidor que efetivamente se beneficiou dos serviços prestados.

Isto porque, trata-se de obrigação de caráter pessoal e não propter rem. O vínculo que se estabelece é entre a empresa responsável pelo fornecimento de água e coleta de esgoto e o consumidor, pois é este quem se beneficia do serviço prestado. Assim, a responsabilidade pela unidade consumidora e a obrigação de pagar a respectiva tarifa só podem ser atribuídas ao consumidor do serviço.

Com efeito, do v. acórdão relatado pelo ilustre Des. GOMES VARJÃO do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, extrai-se que "As obrigações reais são aquelas que nascem em razão da condição de titular do domínio, independentemente da vontade das partes, o que implica dizer que a perda de tal qualidade faz desaparecer a obrigação. Não é essa a característica que se vislumbra na obrigação de que ora se trata, uma vez que ela nasce com o contrato e ulterior utilização do serviço e não desaparece simplesmente pela perda ou renúncia ao correspondente direito real" (Apelação sem Revisão nº 992.06.009860-0).

Não se desconhecendo a polêmica sobre a matéria, como já dito, tem-se que o melhor entendimento é este, principalmente porque, em se tratando de relação consumerista, é preciso que o consumidor tenha fruído concretamente do serviço, o que não ocorreria em se considerando a possibilidade de cobrança tarifária do titular do domínio, quando locado o imóvel a terceiros, como no caso.

Nesse sentido é a jurisprudência:

"PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. FORNECIMENTO DE ÁGUA E COLETA DE ESGOTO. OBRIGAÇÃO PESSOAL E NAO "PROPTER REM" 1- A obrigação decorrente dos serviços de fornecimento de água é pessoal e não "propter rem". Precedentes. 2- Não comprovada a responsabilidade dos ocupantes ou proprietários do imóvel pelo consumo dos serviços prestados pela fornecedora de água, não são eles responsáveis pelo pagamento desses serviços. 3- Apelação provida." (TJSP, Apelação n° 990.09.341560-7, 18ª Câmara de Direito Privado, Rel. Alexandre Lazzarini, j. 23/03/2010).

"Prestação de serviços de fornecimento de água e coleta de esgotos. Ação de Obrigação de fazer. Obrigação que não é "propter rem". Responsabilidade pessoal. Dívida anterior à ocupação do imóvel. Recurso desprovido." (TJSP, Apelação n° 992.08.064193-7, 36ª Câmara de Direito Privado, Rel. Pedro Baccarat, J. 22/04/2010).

"AÇÃO DE COBRANÇA - ILEGITIMIDADE PASSIVA - Serviços de água e esgoto - Cobrança - Recurso que objetiva a anulação de sentença que reconheceu o detentor do domínio do imóvel como parte ilegítima para figurar no polo passivo em demanda com pedido de cobrança por débito oriundo dos serviços de distribuição de água e captação de esgotos fornecidos ao antigo usuário - Descabimento - Hipótese em que se trata de obrigação pessoal - Cobrança que deve ser feita ao usuário anterior do serviço, em se tratando de débito pretérito relativo ao consumo de água por ele deixado - RECURSO DESPROVIDO." (TJSP, Apelação n° 990.10.428138-5, Rel. Ana de Lourdes Coutinho Silva, 13ª Câmara de Direito Privado, J.09/12/2010).

"COBRANÇA - Consumo de água - Obrigação que não se configura propter rem - documentação fornecida pela autora que indica que terceiros, por usufruto, estavam no gozo da coisa no tempo do fornecimento - Inexistência de prova de autoria em expediente fraudulento consistente no consumo irregular de água - Prática de delito que não eqüivale à expressão "débitos de faturas/contas não quitadas" prevista no § 2°, do art. 19 do Decreto Estadual n. 41.446 Inexigibilidade da cobrança contra a requerida - Decisão mantida." (TJSP, Apelação n° 991.07.025935-5, 19ª Câmara de Direito Privado, Rel. Ricardo Negrão, J.30/11/2010).

"PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE FORNECIMENTO DE ÁGUA E COLETA DE ESGOTO - AÇÃO DE COBRANÇA - PRESCRIÇÃO NÃO VERIFICADA - LEGITIMIDADE PASSIVA - TEORIA DA ASSERÇÃO - OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DAS TARIFAS QUE NÃO TEM NATUREZA 'PROPTER REM". POR SE TRATAR DE OBRIGAÇÃO PESSOAL DO CONSUMIDOR. FUNDADA NO EFETIVO CONSUMO - VINCULO OBRIGACIONAL ESTABELECIDO ENTRE CONCESSIONÁRIA DO SERVIÇO E CONSUMIDOR - CARACTERIZAÇÃO DO CONSUMO DOS SERVIÇOS POR PARTE DA RÉ - AÇÃO JULGADA PROCEDENTE SENTENÇA CONFIRMADA - Recurso desprovido." (TJSP, Apelação n° 992.08.049518-3, Rel. Edgard Rosa, 30* Câmara de Direito Privado, J. 19/01/2011).

"Ação declaratória de inexigibilidade de dívida de água e esgoto, contraída pelo inquilino, proposta pelo proprietário do imóvel julgada procedente - Recurso da prestadora de serviço fundado na alegação de natureza "propter rem" da obrigação - Sentença confirmada - A obrigação de pagar pelo consumo de água e esgoto é de natureza pessoal e obriga aquele que contratou e fez uso dos serviços" (TJSP, Apelação com revisão nº 1.108.053-00/2, 35ª Câmara, Rel. Carlos Alberto Garbi, J. 25.02.08)

Outrossim, inexiste solidariedade entre ocupante e proprietário do imóvel, posto que esta não se presume, e não poderia ser criada pelo Decreto nº 41.446/96, haja vista a competência exclusiva da União para legislar sobre a matéria, nos termos do artigo 22, inciso I, da Constituição Federal.

Assim também já se decidiu:

"COBRANÇA - Prestação de serviços de fornecimento de égua não configura obrigação propter rem mas obrigação pessoal, motivo pelo qual é o usuário e não o proprietário do imóvel quem responde pelos débitos - Inexistência de solidariedade entre o locador e o locatário - Inaplicabilidade do artigo 19, §2º, do Decreto Estadual n° 41.446/96 - Competência para legislar sobre direito civil é exclusiva da União Por ser obrigação de caráter pessoal, a divida decorrente do contrato de prestação de serviços de égua e esgoto só vincula a concessionária e o usuário que contratou e utilizou a água - Recurso não provido." (TJSP, Apelação n° 990.10.002480-9, 17ª Câmara de Direito Privado, Rel. Tersio Negrato, J. 17/03/2010).

A partir daí, há de ser reconhecida a inexigibilidade da dívida frente ao autor, proprietário que é do imóvel, mas que na época não o ocupava e não consumiu os serviços, uma vez que estes foram prestados em favor do locatário.

De outra banda, não há dúvidas de que a negativa de fornecimento de água ao autor constitui ato ilegal e arbitrário.

É incontroverso que os serviços em foco estabelecem evidente relação de consumo entre a empresa concessionária e o usuário/consumidor, sujeita às regras da legislação consumerista, como já dito.

A ré, seguramente, encaixa-se no conceito de fornecedora na forma do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor, ao passo que o autor, na qualidade de proprietário do imóvel atingido pelo ato ilegal, é tido, nos exatos termos do artigo 2º, como consumidor.

Outrossim, é induvidoso que o serviço em questão é essencial à vida do homem em sociedade.

Assim sendo, não se questiona que tal qualidade abrange o serviço de fornecimento de água, porquanto é serviço imprescindível para o desempenho de múltiplas funções e atividades pelo homem em sociedade, revelando-se elemento de vital importância para o ser humano, motivo pelo qual confere concretude ao dispositivo constitucional que torna inviolável o direito à vida de qualquer pessoa residente neste país (artigo 5º caput da Constituição Federal).

Por isso, na atual conjuntura econômica, o atributo da essencialidade é inerente não só aos serviços públicos propriamente ditos - indelegáveis por sua natureza, mas também aos serviços de utilidade pública, abarcando, por conseguinte, os serviços pró-comunidade e os serviços pró-cidadão, conforme classificação de Hely Lopes Meirelles.

Dentro desse contexto, não há como negar que os serviços objeto desse feito devem ser fornecidos de forma contínua, vale dizer, de modo permanente, sem interrupção, conforme mandamento extraído do artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: "os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigadas a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos".

Portanto, apenas a eclosão de caso fortuito ou força maior autoriza a não prestação do serviço ou sua paralisação, não sendo admitido que a empresa concessionária, no exercício de odiosa justiça privada, adotando atitude incompatível com o Estado de Direito, crie descontinuidade, para forçar o pagamento de um débito que não é de responsabilidade do autor.

A negativa de fornecimento de água por parte da ré constitui forma de coação para obrigar o consumidor pagar dívida que não lhe compete, o que é inadmissível, por impor inaceitável pressão psicológica. Além disso, o exercício da autotutela pela empresa concessionária distancia-se da harmonização preconizada pela lei, ficando aquém do patamar mínimo de boa-fé, razão pela qual não pode ser admitida.

Por isso, a tutela antecipada deve ser convertida em definitiva, a fim de se manter e impedir a suspensão do fornecimento de água no imóvel do autor em razão do não pagamento do débito ora reconhecido.

Por derradeiro, deixo de condenar a parte ré nas penas da litigância de má-fé, tal como requerido pelo autor, por não vislumbrar qualquer comportamento a ser repreendido de forma tão severa e que encontre respaldo no artigo 17 do Código de Processo Civil.

Ante todo o exposto, e o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a presente ação, e assim o faço para o fim de determinar à ré seja mantida a continuidade do fornecimento de água ao imóvel de propriedade do autor, vedada interrupção pelo não pagamento do débito pretérito, relativo ao período de 16/08/2007 a 22/08/2012, que reconheço como inexigível frente ao autor, tornando, assim, definitiva a tutela antecipada outrora concedida.

Em decorrência da sucumbência, condeno a parte ré a arcar com o pagamento da totalidade das custas e despesas processuais, bem como com os honorários advocatícios da parte contrária, que ora arbitro em 10% sobre o valor da causa atualizado.

P.R.I.

O valor das custas de preparo de recurso no presente feito é de R$ 267,67 e porte de remessa R$ 25,00.

São Paulo, 28 de fevereiro de 2013.

ANA CAROLINA VAZ PACHECO DE CASTRO
JUÍZA DE DIREITO

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STJ - Beneficiário tem dez anos para pedir ressarcimento de cobertura negada por plano de saúde

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser de dez anos o prazo prescricional para propor ação contra plano de saúde para o ressarcimento de despesas realizadas em razão de descumprimento de obrigações constantes do contrato.

No caso julgado, o autor realizou despesas com cirurgia cardíaca para implantação de stent (implante para desobstruir artérias), porque a G. C. se negou a autorizar o procedimento. A empresa, na contestação, afirmou que os implantes estariam excluídos de cobertura contratual.

Em primeiro grau, o segurado não teve sucesso. Apelou, mas o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve o entendimento de que a hipótese era regida pelo artigo 206, parágrafo 3º, V, do Código Civil. A regra diz que prescreve em três anos a pretensão de reparação civil.

Natureza contratual

O beneficiário do plano recorreu, então, ao STJ. Para o relator, ministro Sidnei Beneti, a relação analisada é de natureza contratual, conforme sustentou a própria G. C.. Porém, Beneti esclareceu que a causa de pedir da ação “não decorre de contrato de seguro, mas da prestação de serviço de saúde, que deve receber tratamento próprio”.

Essa hipótese não está prevista no artigo 206, parágrafo 1º, II, do Código Civil, que diz prescrever em um ano a pretensão do segurado contra segurador, ou a deste contra aquele.

Os ministros afastaram, igualmente, a tese adotada pelo TJRS – de que o prazo seria de três anos. O entendimento da Terceira Turma leva em conta precedente da Quarta Turma – órgão também competente para o julgamento de matéria de direito privado no STJ –, no sentido de que o prazo de prescrição de três anos previsto no Código Civil não se aplica quando “a pretensão deriva do não cumprimento de obrigações e deveres constantes do contrato” (REsp 1.121.243).

Sem previsão

O entendimento unânime dos ministros é bem explicitado no voto de Beneti: “Não havendo previsão específica quanto ao prazo prescricional, incide o prazo geral de dez anos, previsto no artigo 205 do Código Civil, o qual começa a fluir a partir da data de sua vigência (11 de janeiro de 2003).”

O ministro também lembrou que se deve respeitar a regra de transição do artigo 2.028 do novo Código Civil. Por ela, quando o prazo for reduzido pelo CC/02, se transcorrido mais da metade do prazo antigo (CC/16) quando da entrada em vigor da nova lei, vale o prazo da lei revogada.

Processo: REsp 1176320

Fonte: Superior Tribunal de Justiça